Mosquito-Road

Não pede silêncio, invade o ouvido, o corpo, a memória

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Mosquito-Road é zunido, gaguejo, fritura, coceira, febre, ironia.
Aqui, quem fala não é o “mosquito” domesticado do dicionário, mas a Muriçoca insubmissa que se apresenta já no início como manifesto.

Não peça explicação nem tradução, o que ela traz é picada. Entre canais de Recife e becos digitais, entre filas intermináveis e slogans de aplicativo, a voz se constrói no atrito. Contra diplomas, contra o verniz polido da literatura, contra a burrice oficializada, contra a miséria transformada em espetáculo.

Os poemas ziguezagueiam como quem foge de uma raquete elétrica — mas, ao mesmo tempo, encontram pouso para sugar o sangue da linguagem. Com humor, sarcasmo, violência e ternura  escondida: é a festa literária das Muriçocas, mas também a memória ferida das ruas. Nada aqui se ergue como monumento. Cada poema é fragmento de enxame, picada que deixa marca, canto que racha a sintaxe, coceira que não cicatriza. A poesia aparece como gesto de sobrevivência, mas também como denúncia da desigualdade, do esvaziamento da crítica, da anestesia digital.

Engana-se quem pensa que a Muriçoca pede desculpas. Ela prefere a afronta, prefere rir da solenidade, prefere cuspir no diploma que não protege ninguém da precariedade da vida. Ler este livro é aceitar a chantagem: ou você entra no zunido, ou será devorado por ele. Entre a raiva e a ironia, entre a fritura e o devaneio, Mosquito-Road arma uma armadilha que é também convite — um chamado a experimentar a poesia como aquilo que ainda pode perturbar, incomodar, resistir.

Não é só leitura: é infecção. É febre. É barulho. É Muriçoca.

O autor

Nascido numa maternidade da Caxangá e criado na Mustardinha, o recifense Diogo Santiago cursou Pedagogia no compasso de Paulo Freire. Após um intercâmbio, ele estabeleceu residência na França, a fim de continuar um percurso acadêmico que o conduziu à criação, à crítica e à tradução literárias. De lá para cá, foram quatro livros publicados no Brasil : O Polvo, Cinco fatias de uma dor urbana, Concatenação e Figuranistas. Após uma década na metrópole lionesa, ele passa maior parte do seu tempo na Provença, no coração da região vitícola das Côtes-du-Rhône.

Trecho do livro

chantagem de Muriçoca

se você                             mesmo

não me matar

eurico

você                                 mesmo

eu pico

 

modesta fritura (começo)

menor é o futuro

do que daqueles

três anos             aqueles

três dois um anos desde

quase certamente porquanto

mantenha-se medo                   uivos

medo meu meço daquilo que só conversa

perto dizia         ela

no quarto asa zunia e ele

babando alforria

pregava                                     longe

novela,

novela minha

com e sem repetição

comício com esse          com isso          romance o

que é

você sabe? […]

 

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Previsão de entrega: Dezembro de 2025.